Planejamento Turístico Municipal

O planejamento turístico aponta como uma ferramenta indispensável para o manejo da atividade. Pois é com medidas racionais e previstas que se trabalha em harmonia – relativa – com o meio, de modo a preservar o turismo do próprio turismo e para o turismo. Pois sem o planejamento, corre-se o risco de o crescimento desordenado da atividade turística atentar contra a atratividade dos recursos e das localidades, que por sua vez figuram como a matéria prima do turismo.

Isso posto, o planejamento turístico é compreendido, por Ruschmann e Widmer (2000, p. 67) como sendo:
o processo que tem como finalidade ordenar as ações humanas sobre uma localidade turística, em como direcionar a construção de equipamentos e facilidades, de forma adequada, evitando efeitos negativos nos recursos que possam destruir ou afetar sua atratividade.
É dizer que para as autoras, o planejamento turístico pretende dispor positivamente as ações dos sujeitos sobre uma localidade ou mesmo um recurso turístico com objetivos calculados, a fim de proteger o recurso propriamente dito, ou mesmo de aperfeiçoar (tanto no sentido de ampliar, como de refrear, ou ainda em sentido estrito) seu uso turístico. O planejamento turístico é, pois, encarado como uma ferramenta racional da gestão de destinos, que visa alterar uma realidade atual por um panorama futuro que se deseja.

Cabe mencionar que o planejamento tem classificações próprias, e estas interessam particularmente a esta reflexão sobre turismo municipal: sabe-se que pode ser classificado em vários tipos, dependendo da abordagem. Para tal, Barretto (1991, pp. 17-21) lista: temporal; geográfico; econômico; administrativo; intencional ou teleológico; e agregativo.

Barretto (1991, p. 21) ainda ensina que o planejamento turístico está elencado em três níveis: 1º. nível: Federal; 2º. nível: Estadual; e 3º. nível: Municipal.

Elucidadas as classificações, níveis do planejamento turístico, faz-se um recorte no que tange ao planejamento turístico municipal e suas especificidades. Este planejamento, classificado com parâmetros geográficos, e alocado no terceiro nível, atende a todas as dimensões supracitadas, e é sobre este que este texto dedicar-se-á.

Pensar o planejamento turístico municipal é pensar não apenas no destino propriamente dito, mas, sobretudo pensar no entorno e na comunidade que este abriga. A relevância de se refletir sobre estas questões justifica-se porque a intervenção a ser realizada diz respeito a mudanças: na base econômica da cidade; utilização do espaço urbano; e vida cultural dos residentes. Algumas dessas mudanças podem ser desejadas outras rechaçadas pelos moradores, e mediar estes conflitos é também tarefa do planejador. Desta forma, Guerrier e Tyler (2001) compreendem que o turismo no âmbito municipal trata de processos sociais de mudança e dos processos de decisão política que ditam a natureza dessa mudança.

O planejamento turístico municipal tem seus objetivos próprios, e isto independe das distintas motivações pelas quais uma localidade decide desenvolver esta atividade. Isso vai variar da necessidade de gerenciar a inevitabilidade do turismo para a regeneração da economia, bem como o aumento da qualidade de vida para a população. A partir desta explanação inicial, pode-se observar que desenvolver os objetivos do turismo municipal leva tanto à inclusão como à exclusão de grupos de interesse no processo.

Para mediar estes conflitos não basta consultar a comunidade local, mas sim incluí-la ao processo convidando-a a participar deste planejamento, que inevitavelmente tocará sua vida. Para tal, é fundamental uma pesquisa sobre o comportamento e influência do entorno. Mudanças, como já dito, podem ser bem ou mal recebidas, e isso vai variar de acordo com a comunidade que as recebe, ou como a comunidade é preparada para recebê-la.

Oferecer oportunidades de negócio e emprego aos locais pode ser um dos principais objetivos do turismo em um município, mas preparar esses atores sociais para trabalhar com o turismo deve ser uma ação deste planejamento. A capacitação deste pessoal é que vai garantir que não seja necessário trazer pessoas de fora da cidade, muitas vezes do país, para trabalhar com o turismo municipal. Até mesmo porque, trazer essa gente de fora, causaria mais problemas ainda. Isto posto, Guerrier e Tyler (2001) colocam que a questão não é apenas a criação de novos postos de trabalho, mas, e sobretudo, o acesso a eles. Algumas questões sobre isso devem ser consideradas, tais como: a mão de obra existente é suficiente em termos qualitativos e quantitativos?; quem deve ser o responsável por esta qualificação: o setor público ou o privado?; a remuneração que estes postos vão gerar é suficiente para compensar tal esforço de capacitação?; quem deve ser treinado?; estas e outras questões devem estar em pauta de discussão e pesquisa, para que o turismo, enquanto atividade, atenda às necessidades dos residentes, e também que seja uma atividade compensadora para o município.

No que diz respeito ao processo social de mudança do município, a imagem sobressai como devendo ser atrativa, com relação ao turista e também ao morador. O processo de criação ou de recriação de imagem torna o município um produto, que irá competir com outros produtos no mercado, sendo consumido pelos turistas. O turista pós-moderno busca o exótico, o diferente, o que é particular a cada destino, mas definitivamente não abre mão do conforto e padrão de hospedagem e alimentação que vive em sua residência habitual. É dizer que ele não se importa em passar o dia num parque, mas ao retornar ao hotel, quer banho quente, lençóis limpos, atendimento em seu idioma de origem. Não quer se aventurar por longos períodos. É compreender que o destino turístico de sucesso oferece excitação e diferenciação na medida em que oferece garantia de conforto e de segurança. Guerrier e Tyler (2001).

Como a população residente enxerga tudo isso? Como se sente posta em uma vitrine turística (não apenas os sujeitos, mas também a localidade como um todo e todas as suas manifestações), sendo objeto de observação e curiosidade pelo outro? Neste aspecto outra vez mais se faz pertinente não apenas a consulta à comunidade receptora, mas também a sua participação, no que tange ao processo decisório sobre o que colocar na vitrine, e o que não.

O turismo sempre irá alterar a natureza do espaço que ocupa, mesmo que esta alteração seja meramente simbólica. O uso e o câmbio de uso dos espaços é uma questão relevante a se pensar no planejamento municipal do turismo. A divisão (oficial ou não) das áreas turísticas e não turísticas da cidade, pode levar a descontentamentos: a área turística receberá maior atenção do poder público no que tange a investimentos, e será uma área planejada para receber pessoas de fora. A área não turística é aquela em que a população vive sua vida distante do fausto do turismo, e muitas vezes sem recursos ou atenção do setor público. Mediar esta questão é fundamental, uma cidade que é boa para o morador será boa para o turista, é dizer: não esquecer as áreas não turísticas do município em seu planejamento maior, e no planejamento turístico integrar a sociedade local no uso dos espaços turísticos, para que percebam que as mudanças ocorridas neste aspecto não beneficiam apenas ao grupo de pessoas que vêm de fora, mas a ela também podem ser estendidos os benefícios destas mudanças.

Entretanto, o uso dos espaços turísticos não são fixos. A cada momento podem-se criar novas áreas de entretenimento para turistas e residentes, ou reutilizar através de revitalização de ambientes: igrejas em museus; indústrias desativadas em shoppings ou centros de cultura; áreas portuárias em desusos por espaços gastronômicos e noturnos, e assim por diante. As intenções destas ações podem ser muitas, desde a ampliação da oferta de atrativos turísticos até a minimização da pressão sobre a capacidade de carga de alguns locais. Nesta reflexão, a capacidade de carga deve ser vista não apenas desde o ponto de vista físico, mas também em termos sociais e antropológicos.

O uso dos espaços gerados pelo turismo pode trazer conflitos, isto já foi compreendido, contudo, não se explanou sobre os diferentes conflitos que este uso pode gerar: residentes e turistas; residentes e residentes; e turistas e turistas. Isto em razão dos diferentes interesses que uma área turística pode comportar. A questão que se oferece é: como intervir sem descartar os públicos, ou mesmo sem descaracterizar o ambiente. Sobre este aspecto, vale observar as mudanças culturais que o turismo pode promover, tanto advindas dos turistas, como advindas da própria dinamicidade da comunidade receptora que através do visitante vislumbra uma forma diferente de organizar sua vida.

São estas diversidades e considerações particulares que fazem do planejamento turístico municipal único em seu campo de atuação como também as pesquisas que podem oriundar a partir deste campo fértil das ciências sociais. É no município que parte do planejamento nacional, estadual e regional acontece de forma factual, e é este quem vai receber os ônus e os bônus da atividade turística, é no planejamento turístico municipal que as transformações chegam ao seu ápice em termos de complexidade Guerrier e Tyler (2001). Sendo um espaço em que coabitam diferentes interesses, comunidades, e ambientes torna ainda mais característico este seu aspecto de particularidades. Nestes termos, o desafio será sempre como trabalhar a atividade turística sem aviltar a comunidade local, provendo-lhe benefícios com os câmbios que a mesma sofrerá com as mudanças que o turismo irá promover.

Desta forma, e a fim de promover estas mudanças satisfatoriamente, o turismo municipal deve adotar abordagens multidisciplinares, com enfoque para o gerenciamento de mudanças e a natureza política da tomada de decisões.

O planejamento turístico municipal pretende entre outros fornecer emancipação dentro das políticas estaduais e nacionais, para as ações de turismo, descentralizando a tomada de decisões. Contudo, para tal planejamento obter sucesso é necessário que a localidade tenha: estrutura administrativa em sua organização no que diz respeito ao turismo; políticas de turismo municipal, coadunando com a estadual e a nacional, e em relação com as demais pastas da administração municipal; trabalhar com a comunidade e com o trade sobre a conscientização da importância da atividade turística; conhecimento da demanda real, se existir, e potencial; inventário minucioso da oferta turística; diagnóstico; e conhecimento profundo do mercado, e isso inclui os mercados concorrentes.

Mediante esses aspectos é possível partir para a determinação de objetivos claros, para os quais todo o processo de planejamento orientar-se-á. Não existe uma receita a qual as localidades devem seguir para auferirem o planejamento turístico de sucesso, pois cada uma está inserida em um contexto distinto, e deverá receber tratamento diferenciado também, contudo, o respeito pela comunidade e seu ambiente, bem como as etapas técnicas e básicas do planejamento turístico devem ser observados, com vistas à sustentabilidade do planejamento em si, e que dele oriundem objetivos a longo prazo que possam garantir a sustentabilidade do destino turístico.

Referências:
BARRETTO, M. Planejamento e organização do turismo. Campinas: Papirus, 1991.
BENI, M. Análise estrutural do turismo. São Paulo: Senac, 1998
GUERRIER; TYLER. Gestão de turismo municipal. São Paulo: Futura, 2001.

Por Ms. Poliana Fabíula Cardozo
Universidade Estadual do Centro-Oeste (Paraná)
Departamento de Turismo - Campus Irati